CEM HISTÓRIAS DO ARCO DA VELHA
Lembro-me de ter uns cinco anos e não dominar as letras, mas havia meninos ao meu redor e eles aguardavam as histórias, os olhos atentos. Eu não tinha como retirá-las dos livros. Eu fingia encontrar as letras e passava o dedo sobre as linhas. Assim eu inventava histórias.
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domingo, 1 de setembro de 2024
UM LIVRO DE FAZ DE CONTAS
Vovô Calvin e Vó Luísa mandaram pelo Correio uma Caixa Colorida.
Rasga papel, pedra, tesoura, lá dentro tinha de tudo. Duas bonecas de pano, um piano e violão.
Bichinhos pra tomar banho e pra Maitê pequenina tinha até um Babador.
Mas lá no fundo da caixa, quietinho, fingindo dormir - Um Livro de Faz de Conta. Pra sonhar e colorir.
Faz de conta que neste Natal estamos todos juntinhos. Um abraço apertado e no nariz um cheirinho.
Nada de boca coberta, nada de não dar as mãos.
Faz de conta que podemos armar a Árvore na sala, tomar sorvete na praça, regar as plantas no jardim.
Faz de conta que a Vovó escreve histórias bonitas de princesa e caldeirão.
Vovô afina a viola e toca uma nova canção.
- Maitê! Maitê! Maitê! Maitê! Maitê! Maitê! Maitê!
Mas se isso for só sonho, retire a Estrela do livro que ela vai nos visitar.
Do outro lado da cidade, vamos esperá-la chegar. Combinamos a mesma hora que vamos olhar para o céu.
Alice e Maitê de um lado, Vovô e Vovó lá do outro, no meio canções de Natal.
Faz de conta que todos os meninos da Terra ganharam muitos presentes.
Que ninguém está triste, nem ninguém ficou doente.
Que tudo num passe de mágica, com uma picadinha no braço está nos fazendo mais fortes.
Faz de conta que esta história só queria nos ensinar que cuidemos um do outro e tudo volta ao seu lugar.
(A todos avós e netos separados por um vírus malvadinho)
(Luisa Ataide, primeiro texto às netas)
DO LIVRO - PARA LER E BRINCAR, EDitora Delicatta, dezembro/2022
quarta-feira, 30 de novembro de 2022
UMA CASA PARA UM MENINO
Contada por :
Amorosa Violeta Margarida dos Jardins - A Vaca.
Bumba Alegria- O Boi,
Chico Cansado - o Burro
e Breeenda, a Ovelha
Amorosa Violeta Margarida dos Jardins - A Vaca.
Bumba Alegria- O Boi,
Chico Cansado - o Burro
e Breeenda, a Ovelha
Dizem que tudo aconteceu em Belém. Outros juram que foi lá para as bandas de Nazaré. O certo é que um tal de Gabriel recebeu por missão encontrar uma casa para a chegada do Menino-Deus. Ele viajou dias e noites sob tempestades e ventos, sob o calor do sol e o brilho das estrelas. A casa que ele procurava, não poderia ser uma casa qualquer. A casa deveria ter quatro marcos: O Amor, A Alegria, O Trabalho e A Esperança.
Depois de muito viajar, ali estava , sob o maior de todos os clarões da lua: com poucas paredes de madeira, um rasgo grande no telhado - A casa. Na verdade, Gabriel olhando assim do alto, nem achou que era realmente uma casa, mas ele pousou ali suas asas.
Depois de muito viajar, ali estava , sob o maior de todos os clarões da lua: com poucas paredes de madeira, um rasgo grande no telhado - A casa. Na verdade, Gabriel olhando assim do alto, nem achou que era realmente uma casa, mas ele pousou ali suas asas.
Na casa moravam: Amorosa Violeta Margarida dos Jardins, a Vaca. Farta, tanto de leite como de amor no coração.
Bumba – Alegria, o boi. Boi caprichoso, bonito e namorador.
Vivia na casa Chico Cansado, o Burro. Burro sim, mas trabalhador como nenhum outro.
E morava ainda: Breennda , a Ovelha. Bem, na verdade, ela não era assim uma ovelha como costumam ser as ovelhas: enquanto tricotava conversava com as estrelas.
Bumba – Alegria, o boi. Boi caprichoso, bonito e namorador.
Vivia na casa Chico Cansado, o Burro. Burro sim, mas trabalhador como nenhum outro.
E morava ainda: Breennda , a Ovelha. Bem, na verdade, ela não era assim uma ovelha como costumam ser as ovelhas: enquanto tricotava conversava com as estrelas.
Naquela noite, Alegria, o Boi chegava de mais um baile, cantando e rodopiando pela sala, elegante e perfumado como sempre. Parou contudo perturbado com o brilho imenso, do que parecia ser uma estrela entrando pelo buraco do telhado. E foi assim, pescoço torto e rabo espetado, que Amorosa Violeta Margarida dos Jardins - a Vaca o encontrou.
– Alegria, o que foi?
– Essa estrela, minha flor, olhe!. Não estava aí quando eu saí. Que brilho intenso, chego a ficar arrepiado.
A vaca olhou para o céu e ficou também admirada.
– Na última noite, disse o boi. Eu tive um sonho estranho. Sonhei que ali na entrada da porta havia uma cestinha e dentro dela uma criança. O menino era nosso, nós devíamos cuidar dele.
Foi quando naquele momento chegou o Burro.
– O que vocês admiram tanto aí no céu? É uma estrela? E sacou do bolso uma luneta.
– Que estrela admirável! continuou o Burro. Nunca vi uma estrela assim. Sabe eu também tive um sonho. Sonhei que eu estava lá no campo arando a terra. Era de tarde, eu estava já cansado... cansado... quando puxei o arado , ali estava entre o feno espalhado: um menino.
– Hum não sei não, esses sonhos com criança, só pode significar que teremos mesmo um menino. Mas que cheiro esquisito é esse?, falou a Vaca.
– Eu sempre falei para vocês no alinhamento dos planetas que nos traria uma estrela anunciando a Era de Peixes. ... Disse Breennda a Ovelha enquanto espalhava incenso pela casa.
– Todos esses sinais, continuou a ovelha, significam que um novo tempo está chegando. Um tempo que nos ensinará o amor entre os homens.
– Bem, disse o burro. Eu sempre achei essa ovelha esquisita mas devo dizer que alguma coisa está para acontecer. Essa luz intensa, todos nós sonhando com um menino... acho que teremos visita.
– Visita? disse a Vaca. Estejam certos que esta casa não está muito em condição de receber a visita de um menino. Então, VAMOS À FAXINA!!!
E a Vaca distribui vassoura, rodos, sabão e todos iniciaram a limpeza da casa. Trabalharam toda a noite e tão cansados ficaram que adormeceram e não notaram a chegada do visitante. Quando acordaram no dia seguinte, ali estava entre eles: O Menino.
O Menino passou naquela casa, que nem era realmente uma casa, apenas uma semana. Alimentado pelo leite da vaca, adormeceu no lombo do burro. Riu com as piruetas do boi, aqueceu-se com a lã da ovelha. Faz parte da história dele as lições de Amor, Alegria, Trabalho e Esperança.
Que neste natal, você receba o menino. Alimente-o, cuide dele, brinque com ele, conte-lhe muitas histórias e o presenteie a alguém.
Luisa Ataíde
Luisa Ataíde
Do livro- PARA LER E BRINCAR ( Especial de Natal) Editora Delicatta- São Paulo, Br) Edição não comercial
quarta-feira, 13 de junho de 2018
A LINHA E O CARRETEL

Era uma linha branquinha como algodão. Morava numa caixa de costura tão antiga que a tampa não mais fechava e ela via o mundo da fresta da caixa. Moravam esquecidos ali, ela e o Carretel. Um sujeito enrolado e gordo e juntos eram uma família: com nome e sobrenome - O Carretel de Linha Branca.
Esse laço com nó dava à Lili, a linha, conhecer o mundo de longe. Mundo que se movimentava todos os dias a partir das palavrinhas mágicas:
- AO TRABALHO !
E vinham as bailarinas. Linhas coloridas que bailavam sobre a orientação da Máquina de Costura. Lili também sonhava um dia ter uma fada madrinha: uma agulha.
As linhas coloridas faziam laços, flores e até asas de borboletas. Numa alegria única, iam dançando, dançando e espalhando cores. Cores lindas que se misturavam e ficavam mais encantadoras ainda.
Lili olhava tudo e sonhava, mas o Carretel continuava lá: enrolado e quieto.
Um dia, a linha branquinha percebeu que havia algo errado no quarto de costura. As agulhas reunidas na mesa ao lado pareciam preocupadas:
-Às vezes, elas dançam tanto, disse a agulha, que parecem brigar. E isto não está bom, acho que estão cansadas, mas temos tantas encomendas...
Ora, disse a Tesoura. Quando percebo que algo não está bem corto a ponta de alguma delas para dar um descanso.
Lili ficou desolada. Ela nada podia oferecer para as bailarinas das cores. Afinal, pensava, o que pode fazer pelo mundo uma simples linha branca. Esticou-se, esticou-se muito até fazer mexer o carretel. Ele, sonolento e sem esperança confessou que há muito desistira de tudo e conformara-se em dormir o dia inteiro.
- Pois eu acredito que haja alguma coisa que possamos fazer. Proponho abrirmos de vez a tampa da caixa.
Numa última tentativa de espantar o sono, o Carretel esforçou-se também para abrir a caixa. Empurraram, empurraram até ouvir o barulho da tampa esparramando-se no chão.
A Máquina de Costura olhou assustada e viu lá dentro da caixa: a Linha e o Carretel e gritou bem alto:
- AO TRABALHO !
E de repente lá estavam eles, indo direto para o buraco da agulha. E o Carretel pensava: afinal o que posso oferecer ao mundo das cores ? Sou tão diferente deles, sou tão enrolado.
E de repente lá estavam eles, indo direto para o buraco da agulha. E o Carretel pensava: afinal o que posso oferecer ao mundo das cores ? Sou tão diferente deles, sou tão enrolado.
A Máquina de Costura era como um maestro controlando a música. Quando a música começava , as bailarinas das cores esticavam as pernas, os braços, a cabeça e dançavam. Lili, ali no meio delas, não sabia ao certo para aonde ir. Mas, as agulhas eram mestras no assunto e levavam e traziam a linha branca sempre que as outras exageravam no passo. E elas dançavam e riam, sem nenhuma pressa, controladas pela suavidade da nova companheira. E Lili aprendeu a bordar flores, nuvens, sóis, cidades árvores e asas de Beija-Flor.
E o Carretel ?
Saía rodopiando, rodopiando de felicidade.
Luísa Ataíde
Luísa Ataíde
segunda-feira, 3 de abril de 2017
UM GATO JARDINEIRO
Era uma vez um gato
que morava num jardim. Um jardim no meio da cidade. Em volta do muro de pedra
passavam os carros, os ônibus e as pessoas sempre correndo para chegar ao
trabalho ou em casa. Salomão, o gato,
deitava na parte mais alta do muro e preguiçosamente olhava o dia. Fechava os
olhos e abria lentamente, era sua maneira de beijar os que passavam. As pessoas
não estavam muito interessadas em felinos meditantes e iam em frente. Ele esticava
as patinhas da frente com muita força e
saltava para a parte baixa do muro em direção ás folhagens .
Era uma
segunda- feira como todas as que começavam a semana, mas a intensa reunião em
volta do lago chamou sua atenção. A borboleta mais colorida do jardim estava
pousada sobre o tronco da árvore e parecia preocupada. Salomão até pensou em
começar um daqueles piques para pegá-la, mas desistiu da brincadeira, ela
parecia muito séria.
As lagartas e
gafanhotos aumentavam o círculo em volta da árvore e ele foi lá saber o que se
passava:
- Bem, disse
o Louva Deus, eu acho que temos que agir rápido, as máquinas chegam em duas
semanas.
Ali estava a
novidade do dia : a destruição do Jardim. O Beija-Flor comunicou que o projeto
poderia ser adiado se a chave do trator fosse confiscada, por ele, é claro.
Salomão
ondulou o rabo, enquanto ia de um lado ao outro.
- Aqui é
nossa casa, e até então ninguém se importou com ela. Temos de pensar em algo
muito rápido.
- Quem você pensa que é ? perguntou o jabuti. O Rei Leão ? Com vinte
horas de sono por dia, não vai conseguir fazer muita coisa.
- Não temos
um rei por aqui, Sr. Jabota, mas podemos pensar juntos. Tem alguma sugestão ?
- Bem, sem
nenhuma ofensa, eu acho que temos que arrumar a casa primeiro. Isto aqui está
muito abandonado, nem o sol consegue entrar.
O gato olhou
em volta e viu dezenas de companheiros assustados. Os macacos nos galhos,
enroscados pelos rabos, pareciam estar
aflitos.
- Se
pensarmos que em duas semanas podemos mudar tudo isso e chamar a atenção de
alguém que possa nos ajudar... acho que poderemos salvar o jardim, disse o
gato.
Limpar a orla
do laguinho era bem razoável. As poucas pessoas que cruzavam o jardim
arremessavam latas de refrigerantes e guardanapos de papel. Aquilo era pior que
a terceira guerra no mundo. Um tiro ao alvo para acertar as cabeças.
- Sem falar
que não há calçadas aqui dentro e eles pisam em qualquer lugar com suas botas
gigantes, disseram as minhocas. Podemos ser trucidadas a qualquer instante, morremos
de medo. Com o que foram aplaudidas
pelas formigas e besouros.
O gato deixou
a preguiça de lado e explicou para todos as medidas apresentadas e havia muitos
a favor e outros contra. Umas foram imediatamente rejeitadas, como a das
aranhas de construir um muro gigante de teias que isolasse o jardim. Duas
semanas era um tempo, muito, muito pequeno. Mas era o que tinham e começaram a
agir. O macaco desenhou diversos cartazes e espalhou pela cidade.
SALVEM O JARDIM MUNICIPAL, dizia.
O que move o
mundo é a urgência e quanto menos tempo temos para resolver um problema, mais
rápido vem a solução. Foi assim com os
moradores do Jardim.
Eles
limparam, podaram, cortaram, arrastaram, varreram, pintaram... e tantos outros
verbos possíveis para mudar alguma coisa.
Mas essa é a
história de um gato que não sabia, mas era um gato jardineiro. Ele saltou pra
dentro do muro da biblioteca pública e abriu todos os livros sobre plantas e jardins. De posse dos conhecimentos básicos de
jardinagem, passou para eles tudo que aprendera. A maioria já tinha os
conhecimentos de adubagem como as Senhoras Minhocas, e de regar e
espalhar sementes como os passarinhos. Mas o que faz um milhão é a união das
unidades, e todos iam e viam concentrados em limpar e reerguer o jardim.
Dormiam muito
pouco, até o gato, que coordenava tudo, separando as mudas das plantas. Mudas
que já moravam no jardim há muito tempo, mas estavam espremidas e sufocadas sob
as folhagens, sem sol e pouca chuva.
Chegou o
grande dia. Lá estavam os tratores em frente à entrada do portão principal. Mas
agora, era um jardim espetacular que eles iam derrubar. Um jardim pequeno, mas
maravilhosamente melhorado. Havia plantas com frutos e flores sob o sol, um
lago limpo brilhava suas águas e os peixinhos nadavam ao lado dos patos. As
pessoas podiam passar pelas calçadas em linha reta que atravessam o jardim e as
minhocas e formigas estavam salvas. O gato espalhara meticulosamente pelos
quatro cantos flores encantadoras. Os frutos das árvores podiam ser colhidos
pois os galhos pontiagudos tinham sido podados . Salomão, o gato estava lá á
frente da população do jardim, como um rei felino defendendo a floresta. Era um bom governante, tinha sido eleito.
A notícia já
corria os quatro cantos, no jornal, na televisão, na internet.
“SALVEM O
JARDIM”, nós já o salvamos , diziam os bichos.
As máquinas
tiveram que recuar suas bocas enormes, pois as pessoas se espremiam em volta do
Jardim Municipal. Ainda não era tudo, mas a cidade estava do lado deles e isso
era muito bom.
O tempo
passou e o Jardim foi tombado e virou patrimônio da cidade, assim quando você
tem um brinquedo e tem de cuidar dele para todo o sempre, porque ele é muito
especial.
Salomão
continuou à frente de separar mudas e discutir medidas que ajudassem a manter o
equilíbrio da flora e da fauna. Tudo o que fosse importante para todos era
levado em conta.
Era uma
cidade, misturada no meio de outras, mas com um jardim no centro com flores e um lago limpo. Os pássaros e
minhocas viviam em harmonia, os macacos corriam de galho em galho e vigiavam
tudo, atentos ao bem estar do meio ambiente. Um gato jardineiro dormia debaixo
da paineira o tempo suficiente para descansar.
Jardineiros podam ervas daninhas e fazem florescer vidas. Ele trabalhava
para o bem de todos.
Luísa Ataíde
sábado, 14 de janeiro de 2017
FALTA UM CABELO AQUI.
O menino
olhou pra fora da janela e disse:
- Não vou à
escola.
No sábado o
menino olhou pra rua e disse:
- Não vou ao cinema.
O menino
olhou o dia e disse:
-Não vou à
escola, não vou ao cinema, não vou sair. Não vou, não vou, não vou.
- O que foi
perguntaram ao menino ?
- Falta um
cabelo aqui. Disse apontando pra cabeça. Estou ficando careca. Eu não sou
velho pra ser careca.
Ninguém via
nada.Olhavam de cima, olhavam de lado, tudo igual.
- Não vou, não vou, não vou, dizia o menino igual carro emperrado.
Passaram-se
os dias, passaram-se os meses e o menino na frente do espelho, sempre lá.
- Falta um
cabelo aqui. Falta um aqui também,
chorava.
Veio a mãe,
o pai, o barbeiro, massagista, psiquiatra, ritalina, espirulina, , fluoxetina
... e nada.O menino continuava triste. Remédio de benzedeira, de cozinheira, de
farmácia.
Passa
gengibre, cravo da índia,óleo de ríseo, óleo de côco, esfrega ,
esfrega , mais alecrim ... um pedacinho
de canela, um pouco de cravo. O menino já estava virando doce.
Nasceu o
primeiro fio, o segundo fio, e muitos outros. O menino olhou o espelho,
olhou, olhou e disse:
Não vou sair de casa.
- O que foi
perguntaram ao menino?
- Nasceu uma
espinha aqui. Falou apontando pro nariz.
L.A
sexta-feira, 13 de janeiro de 2017
RESMUNGA MUNGA
Era uma vez
uma gatinha esplendorosa. Munga tinha os
olhos azuis que se fechavam bem
devagarinho. A cauda preta balançava de alegria de um lado pro outro. O pelo
era marrom macio, e as patinhas pareciam ter pisado a neve: vestidas sempre com
meias brancas. Dizer que aquela gata era bonita eu diria não ser muito justo,
ela era mesmo esplendorosa.
Mas ela andava triste. Se davam Bom dia
ela dizia:
- Naummmm
Tudo bem?
- Naummmmm.
Os dias eram
um doído não. Ou talvez um oiiimmm. Aquilo era toda hora, todo minuto, todo
segundo, sempre. A gatinha resmungava
sem parar. Não comia, não brincava, não sorria. Pulava o muro para a
casa vizinha, queria fugir do nauuummmmm. Voltava no final da tarde e tudo
continuava doído e triste como um não ou:
- Oiiimmm,
ummmm, naoooummm, aiiiiii, aiiiii.
Por que
resmunga Munga?
- aimmmmmm.
Alguém pegou
ela no colo e ela chorou um miado mais agudo ainda. Alguém encostou na patinha
e o maior nãummmm do mundo pulou lá de dentro. Alguém segurou a patinha de
Munga e viu: um sinalzinho preto pra fora, querendo sair mas não podia.Era o
espinho da roseira que morava ali, a quanto tempo ninguém sabia.
Alguém puxou
o espinho com força, com tanta força que quase arrancou o pé
de roseira inteiro do espinho. Munga amanheceu feliz.
Bom dia
Munga
- Miauuu!
e saiu
balançando seu rabinho esplendoroso.
Às vezes o
que não nos deixa sorrir é só um espinho no pé.
L.A
sábado, 20 de agosto de 2016
AZUL E VERMELHO
Era Uma vez
um Vale. Um lugar tão
maravilhosamente lindo, que podíamos pensar que era impossível não ser feliz ali. As flores eram de todas as cores, os pássaros cantavam. O céu era claro e limpo. O sol aparecia
para dar brilho ao lugar, e o vento suave brincava entre as árvores. No meio do
vale havia o rio que tornava o lugar mais fresco e cheio de vida. Os
peixes corriam ligeiros na água limpa, iam e viam entre as pedras em perfeita
harmonia. Do lado direito do rio, viviam
as pessoas que amavam em demasia
a cor do céu. Cultivavam as mais
variadas flores azuis: Agastaches, fúcias, erinus, e centenas de
outras. Aonde houvesse uma flor
azul, eles buscavam a semente e espalhavam no jardim. Vestiam-se
dos mais variados tons de anil, e cobriam as ruas entre as casas, de
pedras água marinha e topázios azuis de todos os tipos. Eles consideravam-se calmos e tranquilos, e respiravam essa
harmonia índigo.
Mas lá, do
outro lado do rio moravam outras pessoas. Elas amavam em demasia o
vermelho. Eram corados e alegres, determinadas em defender o vermelho
das flores, dos alimentos, as pedras de rubi das calçadas e vestiam-se dos mais
variados rubros tons deste mundo. Afinal, pensavam : como alguém pode não
amar um tomate vermelhinho e suco de morango, ah, não existe nada melhor.
A Bandeira na entrada do lugar era um mastro que flamulava um
pano cor de sangue e isto, segundo eles, espalhava coragem e bom humor.
Bem, eles não olhavam com nenhuma boa vontade alguém que não
pensasse assim. Alguém que não amasse suco de beterraba, e
a parte mais doce da melancia. Então , às vezes, o povo vermelho se
enfurecia com o povo azul. Para eles, aquele povo era triste e desanimado. O povo azul esquecia -se que era um povo zen e
equilibrado e lá do outro lado da ponte gritavam:
- Seus comunistas !
Aos que os
vermelhinhos respondiam:
- Seus
moribundos !
E começava a
guerra.
Ninguém
contudo ultrapassava a ponte, afinal pisar num solo em que as pessoas não
amavam as coisas como você era a última coisa a ser pensada. As ameaças e
planos de guerra eram feitos e ficavam cada qual com seu exército, parados na entrada da ponte, com as lanças
apontadas.
Houve um dia
que os ânimos ficaram tão exaltados entre eles, que preparados
para dar início a batalha que estenderia, finalmente, a bandeira
azul ou vermelha no vale, não perceberam que a natureza enfurecera-se com tanta discórdia e desabara sobre eles. A tempestade de raios e
trovões derrubou árvores, casas, espalhou o que podia pelo caminho. Choveu tanto que inundou a ponte e ninguém sabia mais aonde começava ou
terminava o país azul ou vermelho. Determinados a reerguer as cidades eles misturavam-se entre muros e cercas. E de repente lá vinha correndo
pelo que parecia ainda ser a ponte: o homenzinho. Era um homenzinho
franzino e ligeiro e corria de um lado para o outro gritando:
- É ouro, é
ouro !
-OURO ? disseram todos
-É ouro, insistia o homenzinho. Aqui nesta ponte tem ouro. Um pote de ouro
-Um pote de ouro ! gritaram todos .
E
procuravam, procuravam correndo de um lado para o outro. Acabavam entrando ora
no país azul, ora no país vermelho. Os índigos, acharam engraçados o
suco de morango e salada de beterraba e resolveram provar a parte mais
doce da melancia.
Os alegres vermelhos, acharam encantadoramente lindas as ruas cobertas de
pedras topázio azuis e as flores esplendorosas do jardim.
-Ora, ora,
ora, disse maravilhado o
homenzinho, aqui está o pote de ouro !
homenzinho, aqui está o pote de ouro !
No centro da
ponte ali estava um pote imenso, e como ninguém nunca tinha ido
até o meio da ponte, conheciam pela primeira vez o pote.
Olharam no fundo e lá estava :
Ouro de
todas as cores. Cores, verdes, azuis, vermelhas, lilás, rosa, marrom, amarelo e
todos os tons possíveis. Um pote de cores. Eles enfiavam as mãos nas
cores e riam de felicidade. Surpresos , percebiam algo além de vermelho e
azul. Viam, juntos, as flores brancas que espalhavam perfumes por
todo o vale, florzinhas amarelas, rosas, de todas as cores possíveis e
eles admiravam-se com tudo. Como existia algo tão bonito além do azul
e vermelho, como isso era possível . ?
E o
homenzinho espalhou o pote de ouro por todo
o vale.
o vale.
As vezes, é preciso ir lá fora, conhecer a cor do outro, ensinar a sua, misturar as cores e construir juntos o pote do arco-íris.
Luisa Ataíde
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